sábado, 17 de abril de 2010

APENAS PASSARINHOS

Vi uma família chegar ao cemitério. Um homem, uma mulher e uma menina criança. Do Voyage vinho o homem retirou um latão, uma pá e uma caixa com azulejos azuis. Já sobre o muro, observei a entrada. Vagarosos, caminhavam pelo campo, aparentemente sem se preocuparem com direção. O homem, impassível. A mulher, inanimada. A menina criança, dispersa, talvez pensando na brincadeira que foi interrompida, ou não. No Campo Santo, só os passarinhos cantavam. Pareciam apenas passear, não buscavam um túmulo. A menina criança observava as fotos, sorrindo diante de algumas. O homem e a mulher apenas andavam. De repente, um sinal vital. O homem sinaliza com a cabeça, virando para esquerda. De costas para mim, os sinais somem. Só pude notar o gesticular dos braços. O homem coloca a caixa de azulejos em cima do latão, abraçando-os. A mulher segura a mão da menina criança. No Campo Santo, só os passarinhos cantavam. Depois de alguns momentos, viraram novamente à esquerda. Já os via de perfil. Pararam. Era o Céu dos Anjinhos. Mais alguns passos. Cruz 559. O latão, os azulejos e os joelhos no chão. A mulher cruza os braços. A menina brinca com velhas flores de outras covas. Pá, cimento e azulejo. Apenas passarinhos. E o homem construía uma gaiola para um passarinho.

S.C.M.

4 comentários:

  1. "Cantam por que o instante existe"!!!


    Gostei do conto

    ResponderExcluir
  2. Morte(cemitério) X Vida(canto dos passáros)
    nada óbvio o final... Surpresa essa gaiola ...

    ResponderExcluir
  3. HEHE.... vc acredita que só depois que eu escrevi esse conto eu me lembrei desse poema do Mario Quintana, citado pelo Saulo? Pior que tem um pouco a ver mesmo - o conto com o poema, claro.

    ResponderExcluir